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quinta-feira, 23 de julho de 2015

A questão do merecimento



Numa postagem anterior eu me recordava de 'A Vida é Bela', com a lembrança do sacrifício de um pai, num esforço para poupar o filho da realidade.

Quantos de nós não estão neste momento repetindo a trama ? Enquanto escrevo vem à cabeça o querido Felix, leitor do blog que não conheço pessoalmente mas que me ligou despedindo-se, pouco antes de abandonar o Brasil em busca de futuro para as filhas pequenas.

Leio no editorial de hoje do Financial Times (23/07) que 'a podridão cresce' neste país, comparado a um 'pesadelo sem fim', e cuja 'magia' foi quebrada por 'incompetência, arrogância e corrupção'. O cenário é recessão por um período minimo de três anos.

Confira:

http://www.bbc.com/portuguese/noticias/2015/07/150723_pressreview_ft_hb 

Lembro-me do quanto fui politico na entrevista para o Globo Rural. Explicava à super competente repórter Helen (abaixo) que eu mesmo era o culpado pelo trâmite arrastado no licenciamento do NSG: para se montar um serpentário existem passos a seguir, e eu começara do final, pelas cobras. Ao que ela retrucava, 'mas sem planejamento ...', entendendo que eu fui simplesmente a unica opção contra o abate sistemático de uma animal em vias de extinção.




Dr. Vitor Cantarelli já liderou o Ibama na gestão de fauna silvestre, mas optou por afastar-se em função da mentalidade arrecadatória (versus a mentalidade instrutiva) e da visão prevalente no órgão de natureza como museu intocável, sem 'utilitarismos'. Dr.Vitor sempre foi tido como um homem sem meias palavras e sem meias verdades. Recordo-me de atritos públicos seus com a presidência do Ibama, e fortes retaliações em seguida. É um sujeito do qual tenho saudades.

Homem de campo, cientista completo, visitou-me em Serra Grande e não se conteve ao avistar nossa primeira grande Lachesis sob uma canoa da Bahia apodrecida, comprada para servir de toca: ' ... mas que LIIIIIINDA ...', exclamou sincero, mergulhando a seguir numa conversa leve sobre nossas intenções e o potencial deste 'experimento único, modelo para o mundo' para a pesquisa biomédica. O contraponto à visão de natureza 'como museu'. 'Preservação sustentável', onde a banalidade do bem vê 'utilitarismo e exploração':

http://www1.folha.uol.com.br/colunas/luizfelipeponde/2015/07/1654944-a-banalidade-do-bem.shtml  

Outro quadro que deixa saudades é Dra. Nilza Silva Barbosa, do Instituto Chico Mendes (ICM Bio / RAN), que também nos visitou (segunda da esquerda para a direita, abaixo) a muitos anos atrás, perguntou, ouviu, olhou no olho antes de posicionar-se.





Tanto Dra. Nilza quanto Dr. Cantarelli estiveram comigo nas horas mais criticas, a exemplo deste momento http://lachesisbrasil.blogspot.com.br/2012/07/quando-tudo-era-ausencia-esperei.html 

A leitura do texto gerou o seguinte comentário:

'Como concordar com uma insanidade dessas ? Como remover animais bem cuidados, ambientalmente adaptados, vivendo em plenas condições de higiene e saúde, para um lugar sem a mínima infraestrutura para recebe-los ? Seria uma CONDENAÇÃO DE MORTE !

Passou da hora dos Órgãos de Meio Ambiente reconhecerem e respeitarem a importância do NSG, principalmente pelos serviços de Educação Ambiental que presta à sociedade.

Nilza Silva Barbosa
Coordenadora da Área de Educação Ambiental do RAN, Centro Nacional de Pesquisa e Conservação de Répteis e Anfíbios, ICMBio'


Hoje, quando o jurídico do Ibama já decidiu sobre a permanência das surucucus em Serra Grande, transformo minha memória em homenagem à estes poucos funcionários públicos que se destoaram no processo de licenciamento do NSG ... 'recomendo que tente se colocar na posição do cidadão', disse certa feita (vide link abaixo) Dr. Cantarelli a um quadro do Ibama BA, concluindo:  'nada justifica uma análise de projeto se arrastar por mais de cinco anos ...'

http://lachesisbrasil.blogspot.com.br/2014/09/vaquinha-sos-nsg-fund-raising-e-obrigado.html

E já se vão doze anos de espera.

Mas estamos em movimento. Tenho motivos para crer que outro quadro do Ibama também tomou para si a indignação com a indiferença do órgão para com o NSG. É fácil sentir quando se é respeitado. Dra. Hanry Coelho representa essa esperança 'em tempos de podridão crescente', além de 'incompetência, arrogância e corrupção' generalizada na esfera pública.

'Os efeitos da burocracia são a idiotice moral, a estupidez intelectual, o amor ao protocolo e o "não" a qualquer forma de originalidade' (Pondé). Em Serra Grande, de forma milagrosa, os 'efeitos da burocracia' ainda não se traduziram em desemprego e decadência, pois somos quatro, e os quatro fundamentais à operação.

Funcionários foram caçadores-coletores eficientes na Mata Atlântica de Serra Grande. Muitos crânios de caititu me foram inocentemente presenteados no inicio dos trabalhos. Uma oportunidade com todas as garantias trabalhistas reverteu o processo. A sonhada geladeira, abastecida, evita os riscos de se adentrar em território de Lachesis à noite, com visão limitada, atrás daquele latido distante, indicativo de 'proteína acuada'. Mas em tempos de estagflação e incertezas quanto nosso licenciamento, e da própria viabilidade econômica do NSG, tenho me lembrado do Christian (de Claudio), abaixo ...




Viver em Serra Grande é ter emoções fortes, uma atrás da outra. Não pelas surucucus, mas pelo frequente estado de fúria dos elementos. Apoio do Instituto Arapyaú que seria revertido para a folha de pagamentos, teve que ser aplicado - com a autorização da direção do I.A - em nosso sistema de coleta e reserva de água, danificado em diluvio recente. Na postagem 'O quinze' (sobre eventos climáticos de outubro/2014) falo de telhados arrancados e muros destruídos, e assim, o descaso oficial somado aos sustos e gastos emergenciais em sucessão, torna cada vez mais difícil a manutenção do dia-a-dia do NSG.  

A jornalista Helen, avaliando a plataforma de madeira servida por barracas de camping como abrigo (a sede do NSG), perguntou-me se não desejaria ter 'uma casa normal' em Serra Grande ... respondi que para o nível de interação que busco com a mata, aquela estrutura tosca era 'o ideal', perdendo a oportunidade de nivelar-me com os seres do bem, ao não responder que nosso conforto pessoal - meu e de meus filhos - é a ultima das prioridades em Serra Grande. Mas 'e se uma aranha marrom morder meu pau, papai ?', perguntou Luquinha, com medo do nosso banheiro. Em mais um momento 'A Vida é Bela' assumimos juntos a coerência do receio, transformando a realidade do risco em aventura, com a 'inspeção rigorosa do sanitário, com lanternas', antes de usá-lo. Até o dia em que nosso 'banheiro normal' possa ser erguido.




Em outros momentos da gravação, funcionários prestam testemunhos orgulhosos sobre seu oficio. O mesmo Roque dos caititus e espingardas criou-se 'Técnico em Biotério' competente, dominando por completo ciclos reprodutivos, fabricação do alimento (inédito), vermifugação e eutanásia dos ratos que alimentam as surucucus. O mesmo Claudio do machado e motosserra recebe com naturalidade reis e rainhas que nos visitam, sempre com uma explanação complexa sobre a situação da Mata Atlântica no sul da Bahia e a pressão antrópica sobre seus viventes. Humildes por natureza, Claudio e Roque parecem não ter noção do quanto caminharam, e treinam o mais jovem sem rivalidades. Em sua lealdade, somos quatro.

Quando começamos (2001), não haviam referencias praticas e consultáveis sobre o manejo e manutenção de Lachesis no Brasil. Reprodução em cativeiro então, nem se fala. Quando um dado básico como o do peso de ratos oferecidos às surucucus foi apresentado à repórter por Roque, veio a lembrança triste dos animais que perdemos para nossa própria ignorância. E também a lembrança de nossa postura em relação à dividir conhecimento. Tudo o que sabemos foi publicado. Orgulho imenso ver a rapaziada na Venezuela (foto abaixo), Colômbia, Costa Rica, Brasil, valer-se de nosso esforço (publicado) em seus próprios esforços na preservação de Lachesis, e nos escrever contando que 'valeu' ...




Nossa ênfase nesse 'compartilhar conhecimento' se dá por termos experimentado o oposto. Como não havia (2001) e não há no Brasil (2015) quem pudesse apresentar resultados em reprodução em cativeiro do gênero, entramos sem saber na vaidade alheia, sendo boicotados e induzidos ao erro.





terça-feira, 14 de julho de 2015

Arte Laquética



Assim como nós humanos, as cobras também 'trocam de pele'. Nosso processo é um ciclo de descamação continua, com substituição de células decadentes ou mortas por celulas novas. Enquanto nossa renovação da pele se dá de forma fragmentada, com as cobras ocorre uma substuição em monobloco de pele velha por pele nova, a chamada ecdise.

A ecdise ocorre para que o animal cresça, expanda em volume, e também elimine parasitas externos. Sua frequência é variável, em Serra Grande a média é uma muda a cada dois meses.

Mudas inteiras, quase 'luvas', são indicativos de saúde do animal e adequação da umidade do criatório. Mudas fragmentadas normalmente indicam ambiente seco e problemas dermatológicos, como ataques fúngicos e bacterianos ao ventre do animal.

As mudas de pele sempre nos foram de extrema valia. Pude observar o trabalho da miríade de seres noturnos da floresta, formigas em especial, na remoção de restos orgânicos - pele inclusive - do interior dos viveiros do criatório. Esta observação nos fez padronizar a tela galvanizada como parede dos viveiros, permitindo e estimulando o transito das 'criaturas da noite' no interior dos mesmos.

O grande desafio dos serpentários abertos ao tempo é o controle parasitário, e nos viveiros de tela atingimos a excelência nesse quesito. Pele, restos de fezes que passaram desapercebidos, carrapatos, larvas nocivas, tudo isso é alvo dos parceiros que vivem sob o folhiço denso da Mata Atlântica, que jamais removemos da área dos viveiros.

Ao longo do tempo contudo, passamos a não mais destinar todas as mudas de pele das surucucus aos 'scavengers'. É material onde descobri importância didática e estética.

A importância didática das mudas foi sua contribuição à análise biométrica dos indivíduos, basicamente idade e sexo, parâmetros fundamentais para reprodução em cativeiro. Abaixo medições de animais de 3 meses a três anos de vida, e estudos de comprimentos de cauda, maiores em machos.





Varias pessoas viram beleza na minha coleção de estampas de Lachesis. Passei então a considerar a possibilidade de venda desse material - com as devidas licenças do Ibama - àqueles interessados a nos ajudar a tocar o dia-a-dia do NSG, sempre no vermelho, sempre no limite.

Parte do material (pele) que vai para as formigas ou para o lixo, passou a ser removido dos viveiros, tratado, plastificado e emoldurado. Também estou testando pintura com aquarela em algumas peças. Abaixo exemplos de 'arte laquética', começando pela imagem dos quadros emoldurados espalhados em minha cama ...




Abaixo detalhes do material plastificado e emoldurado. Começo pela lembrança daqueles poucos gigantes que ainda existem, em amostras toscas, fragmentadas, 'sujas'







Uma linha intermediaria de amostras, com maior preocupação com forma e estética, é o que ilustramos abaixo ...








Uma terceira linha de amostras são aquelas didáticas e mais raras, como estas abaixo. A primeira ilustra 1) o arabesco de cabeça em Lachesis, marcas que não se repetem, a 'impressão digital' do indivíduo, e também 2) a fragilíssima porção cervical do animal, que torna o famigerado 'laço' instrumento proibitivo no manejo deste gênero ...





























Outros dois exemplos de amostras também mais raras e didáticas seguem-se abaixo, e envolvem as caudas dos animais: diferenciação macho e fêmea pela biometria deste segmento específico, abaixo ...




... bem como a rara oportunidade em que se vê o famoso 'espinho' da cauda da surucucu, uma escama adaptada para a vibração da cauda da cobra contra as folhas do solo da floresta, advertindo sonoramente aqueles que se aproximam ... para a maioria dos moradores do sul da Bahia este segmento é capaz de inocular veneno ....




E concluindo, amostras onde tentamos reproduzir os tons originais de Lachesis, em aquarela sobre muda ...






























As plastificações acima tem 30 x 40 cm (tamanho A3), e o vácuo impede deterioração da amostra. Com moldura de madeira (sem vidro) o tamanho da peça fica em aproximadamente 35 x 45 cm, como se vê com referencias na estante de estudos dos estagiários, abaixo ...




Quanto aos custos, uma plastificação A3 grossa custa R$ 7,50* na Copiar, de Belo Horizonte, e as molduras R$ 35,00 cada. Com um preço 'de custo' mínimo em R$ 42,50, e supondo que as licenças de comercialização de material biológico nos sejam de fato expedidas, peço aos amigos do blog que nos deem algum retorno com sugestões de preço final para a comercialização do produto, mais uma tentativa de dar sequencia aos trabalhos pelas últimas surucucus da Mata Atlântica.

*observe que nas amostras 'didáticas' há plastificação sobre plastificação (R$ 15,00)



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