A cobra apareceu com a casa cheia de menino. Sem saber se era venenosa ou não, João levantou-a com um pau, caminhou 300 metros na noite chuvosa, e soltou na mata. Ao retornar, tinham mais duas da mesma especie, no mesmo lugar. Repetiu a operação de realocação.
João é vizinho em Serra Grande. Mandou-me as fotos para saber do veneno e dos riscos, e também preocupado por ter "separado a família".
Senti em seu relato o cheiro da oportunidade. A aventura do João vale mais que qualquer compendio acadêmico sobre reprodução de Lachesis.
Os fatos se deram numa noite chuvosa do dia 16 de outubro de 2012. Essa era a situação local,
observe ali na área de afunilamento do Sul da Bahia, trecho Ilhéus-Itacaré (e casa do João), fortes frentes frias - manchas verdes - em atividade.
Observe agora essa geladeira velha abaixo, imagem gentilmente cedida por Dean Ripa ...
É a câmara fria do Dallas Zoo, onde em 1987, Boyer e colaboradores reproduziram surucucus (amazônicas) em cativeiro pela primeira vez, no mundo. Cio induzido: baixar temperatura, aumentar umidade. Como na entrada de uma frente fria. Na década de 90 Ripa reproduziu pela primeira vez os animais da America Central, com os mesmos métodos.
Faltava o animal da Mata Atlântica, e em 2007 foi a vez do Núcleo Serra Grande entrar para a historia do gênero, graças a uma especial atenção à meteorologia:
http://www.lachesisbrasil.com.br/download/BulChicagoHerpSoc_Vol42Num3pp41-43%282007%29.pdf
Observe que na base da primeira pagina do artigo acima eu já falava da influencia de fenômenos barométricos no cio de Lachesis. E a aventura de João só vem me confirmar tudo isso... As cobras não venenosas que ele encontrou em casa são Corallus hortulanus em tipico comportamento reprodutivo. Muito provavelmente dois machos, na trilha química de uma fêmea que despejou ferormônio no ambiente, por influencia de alterações súbitas de temperatura e umidade, entrada de frente fria. Cio barométrico.
João então não 'separou uma família', no pior cenário evitou que nova família fosse constituída, mas pode dormir tranquilo por ter quebrado o ciclo atávico do abate.
Confira também ultimo paragrafo da primeira coluna da pagina 161:
http://www.lachesisbrasil.com.br/download/BulChicagoHerpSoc_Vol43Num10pp157-164%282008%29.pdf