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sábado, 31 de maio de 2014
Soroterapia em campo
Biólogo, leitor do blog, trabalhando em área infestada por Bothrops jararaca, pergunta sobre aplicação de soro antiofídico, em campo. Sua unidade hospitalar de referencia está à 3 horas do local
Caro Rogério, a administração do soro antiofídico deve restringir-se ao ambiente hospitalar. Uma reação anafilática (reação alérgica aguda) desencadeada pela soroterapia pode ser mais letal que a picada da cobra em si. Nunca se sabe quem desenvolverá essa reação. A dita 'dessensibilização' para aplicação do soro, com prometazina e hidrocortisona, é mera ilusão.
Três horas para se chegar ao socorro no acidente botrópico é um tempo normalmente hábil* para atuação, desde que não se garroteie, e que a vitima seja deslocada com maca, improvisada que seja, pois maior esforço = maior frequência cardíaca = maior disseminação sistêmica. Certifique-se antes se essa sua unidade de referencia está realmente abastecida de soro especifico, e que há mais de um motorista na equipe, para o caso de ser você o acidentado
Invista na prevenção: perneiras até o joelho, e olhar bem onde se leva a mão. Recomendo também que avalie com calma o uso de 'chaps', confira no Amazon.com, perneiras desenvolvidas para as grandes cascavéis norte americanas e que vão até a virilha, com grande conforto. É o que uso.
Existem situações excepcionais onde valeria à pena arriscar com soroterapia em campo. Acidente laquético nas vastidões do norte, socorro à dias do alcance, profissionais na equipe aptos a tratar a anafilaxia (basicamente com adrenalina), é uma dessas situações, onde 10 a 20 ampolas de soro poderiam ser administrados na coxa do paciente, enquanto se segue rumo à unidade hospitalar. Mas não cabe inocente aqui: pode ocorrer broncoespasmo maciço, insuficiência respiratória aguda e necessidade de entubação imediata, com morte por asfixia se faltar equipamento e profissionais especializados.
Aqui http://www.lachesisbrasil.com.br/download/rmna.doc.pdf , da pagina 18 em diante, discuto essa possibilidade do tratamento ser iniciado em campo, em situações desesperadoras. Não é seu caso.
Não deixe de conferir:
http://lachesisbrasil.blogspot.com.br/2013/08/primeiros-socorros-aos-acidentados-por.html
Abraço,
R
PS: coloquei asterisco em 'tempo normalmente hábil para atuação' para dar ênfase à prevenção dos acidentes, e ilustro abaixo a aleatoriedade que pode ser encontrada no ofidismo:
1) sei de um caso comprovado de morte por acidente botrópico em 60 minutos aproximadamente, envolveu mulher adulta, e o terrível azar de inoculação INTRAVASCULAR justo em picada de Bothrops jararacuçu, a maior produtora de veneno entre as Bothrops. Isso mesmo, a presa da cobra acertou o interior de uma veia, despejando veneno direto na circulação.
2) sei de acidente laquético no Pico da Neblina, envolvendo militar e tentativa de evacuação rápida (inferior a três horas) por helicóptero, e que também evoluiu para óbito.
3) sei de criança que morreu em 90 minutos após acidente laquético, no peito, a duas horas do socorro:
http://lachesisbrasil.blogspot.com.br/2011/01/sobre-o-tamanho-verdadeiro-de-lachesis.html
3) durante as filmagens de Fitzcarraldo (Herzog) na Amazônia, um operador de motosserra, nativo, foi picado por surucucu do pé, e se viu no dilema de enfrentar dois dias de barco até o socorro, ou meter a motosserra em sua canela, no ato, amputando a própria perna.
Não pensou duas vezes, garroteou e amputou a seco. O relato está em 'Venomous Reptiles of the Western Hemisphere', de Campbel, e Lammar. 'Quem sou eu para julgar', é o que penso só de olhar para a paisagem acima. Na mesma linha, e mais politicamente incorreto que nunca, não digo que 'jamais garrotearei', mesmo sabendo o que ocorrerá abaixo (distal) do garrote. Situações extremas, medidas extremas.
4) Emanuelle Gallman, morreu minutos após o acidente, estava 'sensibilizado' por acidentes prévios, e houve anafilaxia, como me informou o Dr. David Warrel, de Oxford, amigo da família e maior conhecedor deste caso, em comunicação pessoal: http://lachesisbrasil.blogspot.com.br/2011/08/em-memoria-de-emanuele-gallmann.html FICANDO AQUI A ADVERTÊNCIA AOS COLEGAS TRATADORES PROFISSIONAIS, COM OU SEM ACIDENTES PRÉVIOS.
5) Dean Ripa entrou em estado de choque, colapso completo sem pressão arterial, quatro minutos após acidente laquético, sendo salvo pelo brilhante time de paramédicos que respondeu em cinco minutos à chamada telefônica de sua esposa.
ou seja, um mundo de incertezas se abre após a ocorrência dos acidentes ofídicos, essa é a verdade, como também é verdade que sua imensa maioria é evitável com antecipação, concentração e respeito.
'PREVENÇÃO COMEÇA AO SE RECONHECER O RISCO' (Cavendish e Pearl)
Quanto ao equipamento citado - 'chaps' - confira:
http://www.amazon.com/Nite-Lite-Outdoor-Gear-Zippered/dp/B0057KLJ6M/ref=sr_1_2?s=sporting-goods&ie=UTF8&qid=1401558395&sr=1-2&keywords=snake+proof+chaps
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